Como é sabido, o STF, no julgamento da ADC 49, reputou inconstitucionais os dispositivos da Lei Complementar nº 87/96 que previam a incidência do ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, concedendo aos Estados o prazo até 31/12/2023 para regulamentarem a transferência dos créditos, sob pena de os contribuintes poderem fazê-lo livremente.
O Convênio ICMS nº 174/2023, que regulamentava a transferência dos créditos, nos termos determinados na ADC 49, foi rejeitado em razão da “não” ratificação pelo Poder Executivo do Rio de Janeiro, nos termos do Ato Declaratório nº 44/2023.
Em 1º de dezembro de 2023, foi publicado o Convênio ICMS nº 178/2023, mantendo praticamente idêntico o regramento contido no convênio anterior, inclusive quanto à obrigatoriedade de transferência de crédito do ICMS na remessa interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade – que já vinha sendo questionada por diversos contribuintes, especialmente os varejistas.
Ao preservar os termos da regulamentação anterior, o novo convênio manteve os problemas já identificados: (1) a obrigatoriedade da transferência pode prejudicar alguns contribuintes; (2) a redação da norma pode não ser suficiente para, na prática, manter os efeitos dos benefícios fiscais em todas as hipóteses; (3) não houve regulamentação do ICMS-ST nas transferências interestaduais entre estabelecimentos do mesmo titular; e (4) o convênio afronta a LC 87/96 ao estabelecer nova base de cálculo para mercadorias não industrializadas.
O atual layout da NF-E ainda não possui campos próprios para atender à nova sistemática. Com o intuito de esclarecer questões relacionadas aos aspectos formais dessas operações, foi publicada, em 6 de dezembro de 2023, uma Nota Orientativa que descreve, de forma provisória, o procedimento de emissão e escrituração de documentos fiscais nas remessas interestaduais de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, em decorrência da decisão proferida pelo STF na ADC 49.
Quanto à emissão das notas fiscais, deverá ser observada a legislação vigente até 2023, adotando-se os campos já utilizados, ainda que não reflitam o significado jurídico da não incidência, exclusivamente para documentar o valor do crédito a ser transferido. O campo de informações adicionais deve preenchido com o texto “Nota fiscal de transferência de bens e mercadorias não sujeita à incidência de ICMS, de que trata a ADC 49, emitida de forma a operacionalizar a transferência de crédito de ICMS”.
Quanto à escrituração das notas fiscais, deverá ser observado o modelo de escrituração com débitos e créditos nos campos de ICMS dos livros de entrada e de saída, no Registro C190, seguindo a legislação vigente em 2023.
Autointitula-se provisória a Nota Técnica porque sua observância será obrigatória até a publicação de ato normativo que defina procedimentos específicos para explicitar a não incidência e a transferência do crédito do imposto.
Um dia antes da publicação da Nota Técnica, entretanto, foi aprovado pela Câmara dos Deputados, por 395 votos a 20 e uma abstenção, o Projeto de Lei Complementar nº 116/2023, que altera a Lei Kandir, prevendo a não incidência do ICMS na transferência de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo titular. O texto da norma já havia sido aprovado pelo Senado Federal em maio desde ano. Agora, a proposta segue para a sanção presidencial.
A novidade é que, segundo o texto aprovado em 05/12/2023, o contribuinte poderá optar pelo pagamento do imposto ao transferir a mercadoria, caso seja beneficiado por incentivos fiscais do ICMS e não queira deixar de usufruí-los.
Em outras palavras, para evitar que empresas beneficiadas por incentivos fiscais do ICMS deixem de usufruí-los por não pagarem o tributo nessas transferências de mercadorias, o projeto aprovado permite que essas operações sejam equiparadas àquelas que geram pagamento do imposto, permitindo o aproveitando do crédito com as alíquotas do estado nas operações internas ou com as alíquotas interestaduais, nos deslocamentos entre estados.
O crédito deverá ser assegurado pelo estado de destino da mercadoria por meio de transferência de crédito, limitado às alíquotas interestaduais aplicadas sobre o valor atribuído à operação de deslocamento.
As alíquotas interestaduais de ICMS são: (1) 4% para mercadorias importadas; (2) 7% para operações com destino ao Espírito Santo e estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste; e (3) 12% para operações com destino aos estados das regiões Sul e Sudeste. Se houver diferença positiva entre os créditos anteriores acumulados e a alíquota interestadual, ela deverá ser garantida pela unidade federada de origem da mercadoria.
Caso venha a sanção, o projeto traz segurança jurídica e pode evitar uma enxurrada de ações judiciais envolvendo a obrigatoriedade de transferência dos créditos – que deixará de ser obrigatória – e o consequente risco de duplicidade na cobrança do imposto.
O escritório se coloca à disposição dos interessados para responder aos questionamentos decorrentes da nota técnica e do projeto de lei aprovado.
Cordialmente,
Renata Molisani Monteiro
JOANA GUIMARÃES & PIRES ADVOGADOS